A Pirâmide e o Sanduíche
 
 

Qualquer brasileiro que não tenha passado a vida encerrado em uma caverna já ouviu falar da tal "elite". Ela concentra toda a renda nacional, pois o que não é elite é o seu oposto, o povo. Ela é egoísta, gananciosa, sequiosa de poder, vendida ao estrangeiro, corrupta, avessa à cultura popular, violenta, ardilosa, manipulativa, e seus integrantes são sempre os outros. Ela é a culpada de nosso lamentável quadro social. Já o povo encarna as virtudes da gente generosa e sofrida, é desprendido, fraterno e autêntico; está sempre disposto a festejar e divertir-se, mesmo oprimido pela elite; é pobre e não ambicioso, usa a mágica do "jeitinho" para contornar situações difíceis, pratica a cultura popular e é avesso à influência estrangeira, é honesto e sua consciência é limpa, é pacífico e tolerante, e com infinita paciência desgarra-se do mundo ocidental e constrói uma nova civilização fundamentada na ginga e na lezeira. Uma tal de "Roma Tropical", se não me falha a memória. Já a classe média, ou é apresentada como aliada servil da elite, ou sequer é citada, como se não existisse. É este modelo de sociedade estratificada que aprendemos na escola e que é constantemente endossado pela mídia: uma pirâmide onde o topo (a elite) é estreito, a base (o povo) é ampla, e uma tênue camada de classe média separa ambos.

Mas, uma vez dado nome aos bois, se chamamos os bois pelos nomes e eles não respondem, alguma coisa está errada. Qualquer reflexão um pouco mais atenta, qualquer coisa além da mera repetição de verdades prontas revela que a "pirâmide" tem fissuras. Um aspecto, em particular, é suspeito: o povo e a elite, que deveriam ser entidades antagônicas e irreconciliáveis, volta e meia demonstram uma inesperada afinidade... Dou a palavra a J J Chiavenatto, que escreveu em seu livro tratando do fenômeno do coronelismo:

"O coronel tinha o poder real. (...) Apesar desse poder excessivo, às vezes desproporcional a suas posses, o coronel era um homem rude, pouco polido pela riqueza, semi-analfabeto, com valores que não o distinguia do mais pobre dos sertanejos. A sociedade onde ele reinava supremo era um aglomerado de homens brutalizados pelo meio social, um feudo muito peculiar. (...) mas só a riqueza o separava dos servos que são seus agregados. Cultural e psicologicamente, ele era igual a todo. Daí o dialogo fácil que havia entre o coronel e os cangaceiros, jagunços, pistoleiros, etc. No fundo, eram todos vaqueiros: os que conquistaram a posse da terra de fato mandavam. Os outros, embora oprimidos, obedeciam, porque as ordens não agrediam o conceito que eles tinham de justiça"

É curioso que JJ Chiavenatto, marxista e autor de "Guerra do Paraguai, Genocídio Americano", tenha deixado escapar uma afirmação que, se bem analisada, atinge em cheio os próprios fundamentos de suas crenças, as quais, como é sabido, baseiam-se na dicotomia de duas classes - burguesia e proletariado - que devem necessariamente ser inimigas e opostas em tudo. A Verdade é como um passarinho: quando tentamos caçá-la, foge voando, mas quando a encerramos em uma gaiola, ela às vezes escapole... Os mistificadores volta e meia são traídos por sua inteligência. Idêntica constatação já havia sido feita, não por um sociólogo, mas pelo carnavalesco Joãozinho Trinta, autor da célebre frase: "Quem gosta de miséria é intelectual, o povo quer é luxo". Esta genial inspiração demonstra como não é em absoluto necessário possuir graduações universitárias para se afirmar uma verdade profunda, nem a posse de mestrados e doutorados impede alguém de dizer tolices estúpidas.

E penso que é precisamente a insistência no modelo falso da pirâmide a origem de todos os equívocos nas análises até agora produzidas a respeito de nosso quadro social. O modelo de nossa sociedade, a meu ver, é bem outro: um SANDUÍCHE, onde a fatia de cima representa a classe rica, a fatia de baixo representa a classe pobre, e o recheio representa a classe média. Note que tanto a classe rica quanto a pobre são constituídas da mesma substância - o pão - e estão em contato pelas bordas, o que representa a simbiose em que ambas vivem. A classe média é feita de uma substância diferente (o recheio) mas está cercada e isolada pelo pão.

A simbiose rico-pobre a que me referi é notória e constante em toda a nossa História. Manifesta-se sobretudo em época de eleição: os muito pobres sempre demonstraram a tendência aparentemente contraditória de votar nos muito ricos. Antigamente, isto era explicado pela fraude eleitoral, e depois, quando não havia mais fraudes, pela ingenuidade do povo ignorante e sua propensão em se deixar manipular. Mas na verdade não há contradição alguma nesta atitude: quando o pobre vota no rico, está simplesmente votando em alguém que pensa como ele. Outra "contradição" é o fato de que muitos dos políticos mais comprometidos com as causas populares são indivíduos riquíssimos, como os latifundiários João Goulart e Leonel Brizola. Quem não entende o porquê deve atentar para o fato de que um João Goulart e um Brizola, por sua própria condição social, desde que nasceram estiveram em íntimo contato com pessoas do povo, da cozinheira aos empregados da fazenda. É com essa gente que eles vão conviver desde sempre, experimentando as delícias do clientelismo. Homens com o dobro de sua idade virão pedir-lhes conselhos e soluções para suas pendengas. Eles entendem com perfeição a psicologia daqueles homens simples, dirigem-se a eles em seu próprio linguajar, sabem o que os agrada e o que os atemoriza, sabem como liderá-los, sabem o que dizer para lisonjeá-los, sabem seduzir suas mulheres. São duas fatias do mesmo pão, produto do mesmo meio social, compartilhando dos mesmos valores. Qualquer um que já tenha tido a oportunidade de lidar com políticos em Brasília leva a mesma impressão: embora eles sejam donos de vultosíssimo patrimônio, com muita freqüência são pessoas grosseiras e vulgares, não passando de tênue verniz a linguagem empolada que empregam em seus discursos (que via de regra não são escritos por eles, mas por assessores). Não estão nem aí para a finesse e os refinamentos culturais, coisa que se espera dos ricos. Lembro de uma fita gravada, há muito tempo, onde se ouve a voz de um ex-ministro comentando os esquemas de corrupção onde já esteve envolvido: a linguagem despudorada que empregavam estava pontilhada de nada menos que 27 palavrões, pacientemente contabilizados por mim.

Outro aspecto que assemelha a elite ao povo, ao mesmo tempo que separa ambos da classe média, é a questão dos impostos: só a classe média paga, o rico sonega e o pobre é isento. É óbvio que isso é uma imagem simplificada: nem todo rico é sonegador, o pobre não deixa de pagar os impostos que estão embutidos no custo das mercadorias, e alguns membros da classe média também sonegam. Mas há uma diferença fundamental: boa parte da classe média é constituída de assalariados que tem o imposto descontado em folha, e portanto estão incapacitados de sonega-lo, mesmo que queiram. Os ricos, mesmo não sonegando, tem uma carga de impostos que é, em termos proporcionais, muito inferior à do assalariado (só certos países nórdicos tem uma carga de impostos tão alta como o Brasil). O pobre, se é assalariado, não paga nada porque está em uma faixa salarial isenta de impostos; se é autônomo, integra a economia informal, que também não paga nada. Isso tipifica de forma clara o papel de cada componente de nossa sociedade-sanduíche: a função primária do recheio é pagar os impostos, e a função primária do pão é captá-los.

Bem sei que a esta altura muitos já estarão bradando que é imoral taxar um cidadão que ganha um salário mínimo, e conhecendo-se o valor do salário mínimo, dificilmente alguém discordará disso. O paternalismo permite esta pequenina concessão ao pobre. Mas, para preservar uma pequena fração de seu salário (que é insuficiente, mesmo sem desconto nenhum) se está negando ao pobre uma lição de valor inestimável: o significado da cidadania. Todos enchem a boca para dizer que o governo nega a cidadania aos destituídos, mas se esquecem de que o passo número um da cidadania consiste de cada um pagar o seu imposto. Mas o paternalismo não gosta de cidadãos; ele se sente mais à vontade em meio a dependentes, adultos cujo estado de minoridade se prolonga indefinidamente. Todos nós já vimos mais de uma vez, com profundo pesar, um político corrupto, que foi cassado ao cabo de hercúleos esforços, simplesmente disputar uma eleição e voltar ao poder nos braços de eleitores que sabiam muito bem quem ele era. A explicação é simples: somente eleitores que jamais pagaram impostos são capazes de votar em um candidato sabidamente corrupto. Por que haveriam eles de se importar, se o dinheiro roubado não saiu do bolso deles? De acordo com a moral do homem ignorante, aquele indivíduo não é um ladrão, pois ele não roubou a uma pessoa de carne e osso, mas sim a uma entidade incorpórea e incompreensível chamada "governo". O homem do povo está interessado em obras concretas que beneficiem a comunidade em que vive, e não tem consciência de que cidadãos são todos os que pagam impostos. Se o candidato roubou este tal de governo, melhor ainda: assim ele terá mais dinheiro para distribuir cestas básicas. É essa a verdadeira causa da corrupção no Brasil, e não o fato alegado de que a corrupção seria "traço cultural latino", como é afirmado insistentemente, sobretudo, por indivíduos de origem anglo-saxã. As dificuldades em reunir provas e o lobby político sem dúvida contam, mas se mesmo quando se consegue punir o culpado, ele é absolvido pelo eleitorado, resta concluir que a real origem do fenômeno está na cabeça de um povo que não foi ensinado de onde provém as verbas de um governo.

Um outro aspecto que endossa o modelo sanduíche são as transições entre classes. De modo geral, a mobilidade social é pequena no Brasil, mas de todas as transições, a mais rara é aquela que atravessa o sanduíche pelo meio - isto é, a do pobre que ascende primeiro à classe média, e depois à classe alta. As transições, quando ocorrem, em geral se fazem pelas beiradas onde as fatias do pão se tocam, ou seja, diretamente da classe baixa para a classe alta, como é o caso de um artista popular ou jogador de futebol que aos vinte e poucos anos já tem um patrimônio de milhões. Estudos mostram (e isto no mundo inteiro) que, entre os patriarcas de famílias milionárias, é elevado o percentual daqueles que foram pobres em sua juventude, e tiveram seu aprendizado de negócios derivado justamente das dificuldades que enfrentaram. O caminho inverso também é verdadeiro: se um rico dilapida totalmente seu patrimônio, via de regra ele cai diretamente para a classe pobre, e torna-se um alcoólatra, ou dependente da caridade de parentes. A possibilidade de ele cair para a classe média é reduzida, pois ele não tem um ofício aprendido nem uma rotina de vida própria da classe média, e em geral não tem mais idade para recomeçar algo que não seja o negócio em que sempre esteve envolvido. A transição da classe alta para a classe média é rara, e geralmente só concebível como o estágio final de uma decadência bem lenta. A transição da classe pobre para a média também é rara. Uma vez atingida a classe média, contudo, chega-se a um estado estacionário. A classe média tradicionalmente tem o objetivo de reproduzir-se a si mesma, em um ciclo sem fim: o pai que tem um diploma universitário quer que o filho entre para a universidade, o pai que tem um pequeno negócio deixa-o de herança, etc. A possibilidade de cair à classe pobre deve ser descartada a todo custo, mas a perspectiva de ingressar na classe alta fica mais a nível de um sonho que no mais das vezes é arquivado. Tal como o recheio do sanduíche, a classe média é um compartimento estanque, com valores próprios e bem definidos, que reproduz-se a si mesma a cada geração, com um pequeno acréscimo de membros da classe pobre que conseguiram ascender a ela, em geral pela via do ensino superior ou ingresso no oficialato das forças armadas.

No Brasil, bem como em diversos outros locais de quadro social semelhante, a História registra alguns episódios de transição-direta-sem-escalas de segmentos inteiros da classe pobre para a classe alta, sem que a fisionomia geral da sociedade seja afetada por estas transições. Isto é desagradável de admitir, pois contraria as concepções maniqueístas ao enfatizar que o caráter do pobre não é diferente do rico, e na verdade ambos são equivalentes em termos de objetivos e métodos. Um bom exemplo é o Haiti, primeiro país da América Latina a alcançar a independência, em 1804. Antes desta data, o país tinha uma sociedade bem estratificada: elite colonial branca (francesa) proprietária das terras, a massa de escravos negros, e entre uma e outra, alguns indivíduos mulatos, que em geral também eram proprietários, mas sofriam discriminação por parte da elite branca. Vem a rebelião dos escravos, que é vitoriosa. Ao contrário do que é praxe nesta parte do mundo, o fim da revolução não foi conseguido à base de conchavos com a elite, mas com a derrota total e eliminação desta: os brancos que não fugiram foram trucidados. Ao contrário, também, de todas as rebeliões de escravos até esta data, esta tinha o objetivo de acabar com a escravidão (havia escravos em Palmares, bem como na Sicília durante a rebelião de Spartacus), e efetivamente aboliu a escravidão. A despeito de todos estes aspectos progressistas, o quadro social do Haiti não se alterou, e continua marcado pela miséria e desigualdade até os dias de hoje. Só que a elite não é mais branca: após a revolução, alguns dos antigos escravos assumiram o controle das propriedades que os brancos abandonaram em sua fuga. Uma vez estabelecidos, contudo, comportaram-se de forma idêntica à antiga aristocracia colonial. Outro exemplo encontra-se na antiga elite de seringalistas de Manaus e Belém durante o ciclo da borracha em fins do século XIX. Estes seringalistas (não confundir com seringueiro, que é o trabalhador) vieram do nordeste, e em seu apogeu eram bem mais ricos que a combalida elite nordestina. Mas, ao contrário do que se pensa, seus pais e avós não eram grandes proprietários, mas sim fazendeiros arruinados, filhos sem herança, e mesmo, agricultores sem terra, pessoas que tinham pouco ou nada a perder, e que chegaram como aventureiros no início do ciclo da borracha. Uma vez assegurado o domínio do seringal, entretanto, assumiram um comportamento idêntico ao dos antigos coronéis de sua terra natal.

Esta evidente semelhança de mentalidade entre pobres e ricos deixa claro que a riqueza não altera os fundamentos morais e culturais dos indivíduos. Na verdade, a própria terminologia classe-pobre-média-rica torna-se incoerente a partir do instante em que o modelo pirâmide é retirado e substituído pelo modelo sanduíche, onde deixa de existir o eixo de quantidade de riqueza que atravessa as classes, e desta forma as define. O que de fato define as classes são a educação, os valores e os objetivos que, forjando um projeto de vida, tendem a conduzir os indivíduos aos níveis de renda que são peculiares a cada classe. Assim, a classe média não é constituída por indivíduos cuja renda se situa entre dois patamares definidos arbitrariamente, mas sim por indivíduos que compartilham os valores da classe média, que, conforme é sabido, incluem a educação, o aprendizado de uma profissão, a existência mantida em níveis dignos, a solidez dos laços familiares, a previdência, a pequena poupança, a busca por uma situação financeira estável, a rotina sem grandes riscos, o planejamento conservador, a casa própria, a aposentadoria, a herança a ser deixada aos descendentes. Estes valores foram legados à classe média brasileira por indivíduos que já os possuíam desde gerações passadas. De fato, o cerne da classe média brasileira é constituído de descendentes de imigrantes vindos de várias partes do mundo, que aqui chegaram em uma situação de penúria muito semelhante à da atual classe pobre. O projeto que tinham, entretanto, era diferente, e nota-se que desde o princípio, quando eram ainda colonos rurais, estes imigrantes não procuravam tornar-se latifundiários, mas sim pequenos fazendeiros. Isto ocorria porque esta comunidade de pequenos proprietários, nem ricos nem pobres, antes de se materializar já existia no imaginário daquelas famílias, principalmente daquelas influenciadas pelo protestantismo, que valorizava o trabalho árduo e a parcimônia. Idêntica construção sem dúvida não havia na mente dos ex-escravos haitianos, nem dos camponeses atraídos pelo boom da borracha no Amazonas. Estes indivíduos eram oriundos de um mundo sem classe média, onde as únicas categorias existentes eram o camponês-escravo miserável, ou então o rico senhor das terras. Não sendo a primeira categoria, obviamente, desejável, restava-lhes investir tudo na segunda possibilidade...

A classe média brasileira, embora sustente o estado com os tributos que paga, não tem praticamente nenhum poder político. A explicação é simples: o Brasil é uma democracia, e a classe média é minoritária. Praticamente não há candidatos que representem a classe média. O poder político tem sido monopolizado pela simbiose rico-pobre, a qual, uma vez que o modelo-sanduíche só reconhece duas classes, chamarei de o País Arcaico, oposto ao País Moderno que é a classe média (não gosto dessas definições, por serem maniqueístas, mas admito que não encontro outras melhores). O País Arcaico exerce o poder, ora por intermédio de sua faceta rica - os oligarcas - ora por intermédio de sua faceta pobre - os populistas. A situação não é diferente em todo o resto da América Latina. A única exceção foi a Argentina do início do século XX, quando reformas políticas abriram caminho para a classe média, em conseqüência do quê a Argentina assumiu na época um perfil europeu em termos culturais, políticos e de progresso econômico. O golpe militar de 1930, todavia, reinstalou no poder o País Arcaico que, ora apresentando sua face aristocrática - a oligarquia senil - ora exibindo sua face popular - o peronismo - alijou a classe média do comando da nação, e como se sabe, reconduziu a Argentina a seu destino de terceiro mundo.

Não há previsão de quando a classe média brasileira experimentará o poder. Jamais houve no Brasil uma revolução burguesa, que conduzisse a classe média ao poder. O termo "revolução burguesa", tão consagrado que não posso evitar de mencioná-lo, foi uma entre as muitas distorções que o marxismo impôs à História Mundial, ao associar o termo "burguês" a "grande capitalista, banqueiro, comerciante, industrial". As revoluções americana e francesa foram, então, "revoluções burguesas", supostamente feitas pelos ricos - e não deixa de ser cômico imaginar um gordo banqueiro, imbuído de espírito de aventura, pegar em armas e ir lutar nas ruas... Isto é tolice. As camadas altas do Terceiro Estado, em especial os banqueiros, sempre apoiaram os monarcas (quando Luís XVI emprendeu sua tentativa de fuga em Varennes, levava consigo o dinheiro de banqueiros parisienses). Quem luta em uma revolução é a massa, os sans-culottes franceses e os minutemen americanos não podia ser classificados sequer como classe média, mas como pobres, mesmo, pois quem arrisca tudo é quem não tem nada a perder. Estas revoluções foram taxadas de "burguesas" pelo marxismo, que pretendia reescrever a História, mas ela foram, isso sim, revoluções de classe média. Não porque a maioria dos combatentes fosse da classe média (certamente não era), mas porque nelas foram consagrados os ideais que, mais tarde, seriam associados à classe média que se formou no rastro dessas revoluções - ideais de liberdade política e econômica, de recompensa ao mais capaz ao invés de privilégios, do direito dos contribuintes de exigir a justa aplicação dos impostos, e sobretudo, da supressão de um estado tirânico e sugador que impedia aos cidadãos prosperar a custa de seu próprio esforço. O termo burguês, em suas origens, significava, meramente, habitante dos burgos (cidades). Sua conotação não era de riqueza, mas de independência, posto que as cidades constituíam um espaço que não estava sob controle direto do senhor feudal, e portanto seus habitantes eram livres para escolher sua ocupação, e eventualmente enriquecer. Tal como faz a classe média, até os dias de hoje.

 

 

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